quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Pode ser a gota d'água


Por Paulo Lustosa

Quatro notícias de final de ano para demonstrar quanto a classe média enfrenta de preconceitos, dificuldades e, até parece, um certo clima de perseguição. A primeira delas, relaciona-se com o aumento do IOF sobre passagens e despesas internacionais o que, de maneira mais direta, afeta o segmento. Aliás a jornalista Eliane Cantanhede, em sua coluna no Jornal Folha de São Paulo faz uma abordagem bastante procedente porquanto afirma que, com preços impraticáveis no Brasil, tanto para lazer, para o entretenimento e, porque não dizer, para compras, o caminho é Miami. Aliás, feitos os cálculos na pontinha do lápis, passeando, entretendo-se e abastecendo-se, em Miami, daquilo que é proibitivo comprar por estas bandas, ainda vale e, em muito, pagar os 6,8% de IOF, pois o diferencial de preço mais que compensa a despesa com a passagem aérea e o hotel

Na verdade há um chiste por aqui que, os pobres vão para Miami, os classe média para a Europa e os ricos, passeiam pelo Nordeste, considerando os custos de passagens, hotéis, restaurantes, serviços de toda ordem, e, quaisquer compras!

Mas se esta já era uma má notícia, o fim da redução de IPI para manufaturados, máxime para veículos; a correção, pelo 18o. ano, da tabela do IR, abaixo da inflação, além da necessária revisão dos preços administrados de energia, combustíveis, que deverão ocorrer neste inicio de ano, representa outra “tungada” na classe média brasileira.

Mas, tudo isto ainda é muito pouco diante dos quase 50% de impostos - considerando a carga fiscal atual de 36% e mais, pelo menos, catorze pontos percentuais de impostos indiretos, e, mais ainda, diante do fato que, sòmente ela, a classe média, paga sempre, duas vezes, por determinados serviços essenciais, então a coisa fica muito feia! Diante de uma educação pública de péssima qualidade, as famílias, dessa faixa de renda, são empurradas para a chamada escola privada, pagando anuidades elevadíssimas, tendo despesas de material escolar, transporte, entre outros, cada vez mais exorbitantes.

Se isto ocorre com a educação, já se pode imaginar o que se paga de valores adicionais aos planos de saúde, com hospitalização, médicos particulares, com dentistas, etc, diante da precariedade, das limitaácões e do descalabro que é a saúde pública no país.

E, se isto não bastasse, o que se gasta com segurança doméstica, com sistemas de vigilância, com vigias, com pessoal doméstico, entre outros, para poder se proteger da escalada de violência que toma conta do país, “não está no gibi”!

E, tudo isto, gera indignação e revolta porquanto, nos impostos que o segmento paga, há uma excessiva carga tributária que, embora sendo absurdamente elevada, ou melhor, uma das mais elevadas do mundo, se houvesse a correspondência de serviços públicos gratuítos e de boa qualidade, como ocorre em países da Europa e, até mesmo, em vizinhos do Brasil como o Chile, a Colômbia, a Costa Rica, entre outros, a coisa pareceria palatável. Mas não é o que ocorre.

E, a tendência de tungar a classe média não vai parar por aí, não! No primeiro semestre do ano que se inicia, o STF deverá julgar a ação relacionada à devolução de valores confiscados da classe média, pelo sistema bancário brasileiro, quando da implantação dos planos Cruzado, Bresser, Verão, e Collor I e II. Isto porque a pressão do governo sobre o STF, inclusive fazendo uso da mídia e de argumentos insólitos, tais como, o impacto sobre os fundamentos da economia desse ônus sobre o sistema, pode levar a adiamento ou sobrestamento do pagamento de tal dívida, líquida e certa!

E aí muita gente não entende quais as causas das manifestações de junho passado, fruto que foram, segundo alguns analistas, das angústias, das insatisfações e da impotência da classe média em buscar resgatar compromissos e serviços, fundamentais à sociedade como um todo, que lhe são subtraídos pela incompetência, pela corrupção, pela má gestão e pela irresponsabilidade que toma conta dos governos, máxime o federal que, perigosamente, acredita que pode espichar ainda mais a corda.

Alguns acham que a classe média por ser amorfa, inorgânica e incapaz de organizar-se, não produzirá manifestações de expressão capazes de mudar os rumos das políticas públicas do País porquanto a última grande mobilização da classe média foi de apoio ao golpe militar na passeata dos Cem mil, com Deus, pela Pátria e pela Liberdade, lá pelos idos de 64. Parece que, só diante de um perigo iminente a classe média se manifesta e faz as suas alianças para preservar os dedos. Enquanto só alguns anéis estão em jogo, ela não se move mas, a situação começa a ficar difícil e, quem sabe, quando junho chegar, com a Copa, virá uma sociedade capaz de externar a sua insatisfação e transformá-la em combustível de mudanças no quadro de referências das políticas nacionais.

É bom lembrar a música de Gonzaguinha quando dizia que “não dá mais para aguentar, explode coracão”!

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